19 de jun. de 2009

Culpados ou não?*


* Artigo escrito em 2008 sobre as enchentes em Santa Catarina.


Na semana passada o mundo parou para acompanhar e lamentar o desastre “natural” que devastou Santa Catarina. A mídia nacional se mobilizou completamente, chegando a realizar campanhas para arrecadar mantimentos para os catarinenses. O assunto também foi destaque nos principais jornais internacionais, Le Monde, El país, The New York Times.

Apesar da grande ênfase à dimensão da tragédia e ao número de mortos, outro fator foi constantemente mencionado, a solidariedade do povo brasileiro, que mesmo não tendo a obrigação de ajudar, se esforça para fazê-lo. Mas, espere um pouco, será que realmente não temos a obrigação de ajudar?

Um desastre natural. Mas até que ponto? Há muito tempo o homem tomou posse da natureza e desde então interfere direta ou indiretamente no seu percurso. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU, há mais de 90% de certeza de que a ação humana influencia o aquecimento global, ou seja, nós contribuímos para a alteração climática.

No Brasil esse impacto começou em 1500 com a chegada dos portugueses, seguida da exploração da Mata Atlântica. Eles estavam motivados pelo lucro obtido com a venda do pau-brasil na Europa. Segundo dados apresentados pela ONG WWF, a Mata possui hoje apenas 9% da extensão original.

As enchentes, apesar de resultarem das chuvas, que são obras da natureza, não têm um surgimento independente da ação humana. A impermeabilização do solo, devido à pavimentação das ruas, a constante redução da área verde para a construção de novos estabelecimentos, a alteração do curso de rios e a obstrução das galerias pluviais, devido ao lixo jogado nas ruas pela população, atrapalham o escoamento da água, que permanece na superfície. A invasão de áreas de encostas por loteamentos clandestinos, também contribuem para a proporção dos desastres.

Exemplo claro é o que aconteceu em Blumenau, uma das cidades mais atingidas. Em entrevista para o site do Eco, a professora e pesquisadora de Ecologia de Florestas da Universidade Regional de Blumenau, Lúcia Sevegnani, afirmou que a população local aumentou de 120 para 300 mil habitantes nas últimas décadas. O aumento populacional foi absurdo e resultou na ocupação de áreas de risco, como encostas de morros e beiras de rios – os locais mais atingidos nas enchentes desse ano.

Se o maior responsável pelas alterações climáticas que ocorreram e ocorrem é o ser humano, ele deve, com certeza, colaborar na reparação dos danos provocados. Portanto, não se trata apenas de uma questão de solidariedade, mas de obrigação.

Pelo menos o assunto ‘mudança de clima’ já está sendo pensado. Começou no dia primeiro de dezembro o 14º encontro da Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC). Um dos principais objetivos do encontro é tentar superar os impasses das negociações do novo acordo sobre a redução da emissão de gás carbônico, substituto ao protocolo de Kyoto, para que o financiamento de projetos possa começar a partir do ano que vem.


Se as duas semanas de negociações vão ter algum progresso, não é possível saber. Afinal, a discussão já acontece há uns bons anos. Já está mais do que na hora das ações começarem a aparecer. Enquanto não aparecem, nos contentamos com o “antes tarde do que nunca” e claro, vamos ajudando da maneira como podemos as vítimas da nossa irresponsabilidade e falta de bom senso com os recursos naturais.

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